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Capítulo 2: Capítulo 2

Página 26

«Sim, Nastenka, enganamo-nos, embora contra a nossa vontade, ao acreditarmos que a paixão verdadeira, autêntica, atormenta a alma, ao acreditarmos que existe algo de vivo, de tangível, nos sonhos imateriais! Mas que ilusão; veja, por exemplo: o amor avassalou o seu peito com toda a sua inesgotável alegria, com todos os seus extenuantes tormentos... Deite-lhe apenas um olhar rápido e convença-se daquilo que lhe digo! Bastará olhá-lo para acreditar, minha querida Nastenka, que ele nunca conheceu realmente aquela que tanto amou no seu exaltado sonho? Será possível que apenas a tenha visto entre esses fantasmas fascinantes e que essa paixão não tenha sido para ele mais do que um sonho? Será possível que nunca haja estreitado as mãos dela ao longo de tantos anos da sua vida, sós, entregues a si mesmos, ignorando todo o universo e unindo cada um deles o seu universo, a sua vida, à vida do outro? Será possível que não tenha sido ela quem, ao crepúsculo, no momento da separação, se tenha reclinado, soluçante e desesperada, sobre o seu peito, sem escutar a tempestade desencadeado debaixo de um céu lúgubre, sem ouvir o vento que arrancava e arrastava com fúria as lágrimas que brotavam dos seus cílios negros? Será possível que tudo isto não tenha passado de um sonho, este jardim melancólico, abandonado e selvagem, com as suas áleas provoadas de musgo, solitário e hostil, por onde tantas vezes passearam ambos, esperando, desesperando, amando, amando-se mutuamente, durante tanto tempo, 'tão longa e ternamente'? E essa velha mansão ancestral, insólita, onde ela viveu solitária e triste durante tantos anos, com o seu velho e sombrio marido, perpetuamente silencioso e bilioso, um marido que os assustava, pois eram ambos tímidos como crianças, melancólicos e receosos, ocultando-se mutuamente o seu amor? Como se atormentavam, como tinham medo, como era puro e inocente o seu amor e como (isto é evidente, Nastenka) as pessoas eram más! E, Deus meu, não foi ela quem ele encontrou depois, longe da pátria, sob um céu estrangeiro, meridional e ardente, na maravilhosa Cidade Eterna, no esplendor de um baile, ao som da música, numpalazzo (forçosamente numpalazzo) mergulhado num mar de fogo, nessa varanda engrinaldada de mirtos e de rosas onde, tendo-o reconhecido, arrancara apressadamente a sua máscara e sussurrando-lhe: lesou livre!», trémula e soluçante se lhe lançara nos braços; então, num grito de entusiasmo, apertados um contra o outro, esqueceram num abrir e fechar de olhos 0 desgosto e a separação e todos os tormentos, a espera cruel? O velho, o sombrio jardim da pátria distante e o banco sobre o qual, com um derradeiro e apaixonado beijo, ela fugira ao seu amplexo, aturdida por um sofrimento sem esperança... Oh, tem de o confessar, minha querida Nastenka, foi caso para desejar fugir, para ter ficado perturbado e corado como 'um colegial que acabasse de esconder no bolso a maça roubada no jardim vizinho, quando um rapaz seu amigo, sadio e alto, alegre e jovial, bem falante, abre sem se ter anunciado a porta do quarto e grita como se nada se tivesse passado: 'Sou eu, meu caro, acabo de chegar de Pavlovsk!' Santo Deus, o velho conde morreu, eis enfim a felicidade, uma indescritível felicidade, e nesta altura é que o tal tipo lhe apeteceu chegar de Pavlovsk!'»

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Capa do livro Noites Brancas
Páginas: 67
Página atual: 26

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
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Capítulo 2 14
Capítulo 3 44
Capítulo 4 52
Capítulo 5 65