Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 3: III Pág. 139 / 273

No final de todos esses biliões e triliões de anos, a eternidade mal teria começado. E se essa montanha se erguesse novamente, depois de ter sido removida e o passarinho voltasse a removê-la novamente, grão a grão, e se ela se elevasse e fosse removida tantas vezes quantas as estrelas que há no céu, os átomos que há no ar, as gotas de água que há no oceano, as folhas que há nas árvores, as penas que há nas aves, as escamas dos peixes, os pêlos dos animais, no final de todas essas inumeráveis elevações e remoções dessa montanha incomensuravelmente grande, não se poderia afirmar que tivesse passado um único instante da eternidade; mesmo nessa altura, no final desse período, depois dessa imensidão de tempo, que, só de pensarmos nela, nos põe a cabeça a andar à roda, a eternidade mal teria começado.

«A um grande santo (um dos nossos padres, julgo eu) foi um dia concedida uma visão do Inferno. Teve a sensação de estar no meio de um amplo salão, escuro e silencioso, com excepção do tiquetaque de um grande relógio. O tiquetaque prosseguia incessantemente; e pareceu àquele santo que o som do tiquetaque era a incessante repetição das palavras - sempre, nunca; sempre, nunca. Sempre estar no Inferno, nunca estar no Céu; sempre estar privado da presença de Deus, nunca gozar a Sua beatífica visão; sempre ser devorado pelas chamas, roído pelos vermes, espetado com forquilhas ardentes, nunca se ver livre dessas penas; sempre sentir a consciência fustigada, a recordação enfurecida, a mente cheia de escuridão e desespero, nunca poder escapar-lhes; sempre amaldiçoar e insultar os vis demónios que perversamente exultam com a desgraça das suas vítimas, nunca contemplar o brilho resplandecente dos espíritos abençoados; sempre suplicar, do abismo de fogo, que Deus lhes conceda um instante, um único instante, de tréguas da sua horrível agonia, nunca receber, nem por um instante, o perdão de Deus; sempre sofrer, nunca gozar; sempre estar condenado, nunca ser salvo; sempre, nunca; sempre, nunca.





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