As Viagens de Gulliver - Cap. 5: Capítulo III Pág. 215 / 339

Para se manter os senadores fiéis à coroa, propunha-se que os cargos fossem distribuídos por sorteio. Antes deveriam jurar e prometer que votariam sempre a favor da corte, fossem vencedores ou não; os vencidos poderiam participar no sorteio seguinte. Assim se alimentavam a esperança e o interesse e ninguém poderia queixar-se de promessas não cumpridas, pois todas as destituições dever-se-iam inteiramente à Fortuna, cujas costas são mais largas e fortes que as de um governo.

Outro professor mostrou-me uma volumosa pasta com as normas para descobrir cabalas e conspirações contra o governo. Aconselhava os grandes estadistas a inspeccionarem a dieta de todos os suspeitos, o seu horário de refeições, para que lado dormiam, com que mão limpavam as nalgas; que aspecto particular tinham os excrementos: a partir da sua cor, cheiro, gosto, consistência ou grau de amadurecimento da digestão podem vislumbrar-se pensamentos e intenções. Porque ninguém está tão concentrado, tão reflectido, tão pensativo do que quando se encontra sentado na retrete; a sua própria experiência assim o testemunha. A título experimental, quando assumia esta postura, entretinha-se a imaginar a melhor forma de assassinar o rei; nessa altura, os excrementos adquiriam uma tonalidade esverdeada; mas se pensava só em provocar uma insurreição ou incendiar a capital, a tonalidade era outra.

Todo o discurso revelava uma grande perspicácia e continha numerosas observações, tão curiosas como úteis para um político. Apesar disso achei-as incompletas e manifestei-lhe a minha opinião, propondo-lhe, se o autor acedesse, apresentar dados complementares.





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