Não muito depois, porém, tive a oportunidade de prestar a Sua Majestade o que considerei um grande serviço. Certa noite, fui despertado repentinamente pelos gritos de uma multidão diante da minha porta e invadiu-me uma espécie de terror. Ouvi repetir incessantemente a palavra burglum. Uns quantos enviados do imperador abriram passo através da multidão e suplicaram-me que fosse imediatamente ao palácio porque os aposentos da imperatriz, devido a um descuido de uma aia que adormecera enquanto lia um romance, estavam em chamas. Levantei-me de imediato. Graças a que se houvera dado ordens de abrirem passagem e a que era uma noite de luar, consegui chegar ao palácio sem esmagar ninguém. Verifiquei que já se tinham encostado as escadas aos muros dos aposentos e que havia baldes em abundância, mas a água encontrava-se a certa distância. Os baldes eram como dedais grandes; passavam-mos com a máxima rapidez possível mas as chamas eram tão violentas que se tornava um esforço quase inglório. Podia tê-las amortecido facilmente com a minha casaca mas, infelizmente, com a pressa, não a levara, trazendo apenas o gibão de couro. A situação parecia totalmente desesperada e deplorável. O palácio ter-se-ia incendiado e destruído sem remissão se, caso pouco frequente em mim, de repente não me tivesse ocorrido uma excelente ideia. Na noite anterior bebera com abundância um vinho chamado glimigrin o mesmo que os blefuscuitas chamam flumec, ainda que de pior qualidade que, além disso, era muito diurético. Por aqueles acasos da vida, tinha a bexiga cheia e, com o calor das chamas e o esforço que fiz para sufocá-las, o vinho começou a surtir o seu efeito; senti vontade de urinar e fi-lo em tal quantidade que, dirigido o jorro com pontaria sobre os pontos mais críticos, dentro de três minutos o fogo estava apagado por completo, evitando-se assim a destruição daquele edifício multissecular.
