— Sou eu quem tem de servir-vos e acompanhar-vos — respondeu D. Quixote — e muito agradeço o favor com que sou tratado, e a boa opinião em que sou tido, a qual procurarei, quanto caiba em minhas forças, tornar verdadeira, ainda que perca a vida neste empenho, e mesmo mais que a vida, se mais que ela me é possível perder.
Outras semelhantes expressões de cortesia e oferecimentos continuaram a trocar-se entre D. Quixote e D. Fernando; mas a tudo impôs silêncio um passageiro, que naquele momento entrou na venda, o qual pelo seu vestuário mostrava ser cristão chegado de terra de mouros, pois usava duma casaca de pano azul com meias mangas, de abas curtas e sem gola, e os calções e o barrete eram também de cor azul; trazia uns borzeguins feitos segundo a moda dos mouros, e um alfanje suspenso dum talabarte lançado ao tiracolo. Logo atrás deste passageiro entrou uma mulher vestida à mourisca, com uma touca na cabeça e o rosto encoberto, a qual viera a cavalo em um jumento, e trazia um barretinho de brocado e uma almalafa que a cobria desde a cabeça até aos pés.
O homem era de forma robusta, de agradável presença, contando pouco mais de quarenta anos de idade, algum tanto moreno, barba bem posta e grandes bigodes, e, se estivera mais bem vestido, pelo seu ar e pelas suas maneiras, todos o julgariam como pessoa bem nascida e com boa educação.