Capítulo 42: CAPÍTULO XLI - No qual o cativo continua a sua história.
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Por último, entrando no baixel dos franceses, estes, depois de se informarem de tudo quanto quiseram saber de nós, como se fôssemos seus figadais inimigos, despojaram-nos de tudo quanto tínhamos, e a Zoraida até tiraram os carcasses que trazia nos pés; mas a mim não me afligia tanto o pesar que a ela lhe causavam como o temor que eu tinha de que depois de lhe tirarem estas riquíssimas e preciosíssimas joias, passassem a tirar-lhe aquela que mais valia e ela sobre todas ainda mais estimava; felizmente os desejos daquela gente não se estendiam senão ao dinheiro, e disto nunca se farta a sua cobiça, que então chegou a tal ponto que até os vestidos de cativos nos tirariam, se de algum proveito lhe servissem; e houve entre eles quem fosse de parecer que nos lançassem todos ao mar embrulhados em uma vela, porque tinham tenção de fazer negócio em alguns portos de Espanha com o nome de bretões, e que, levando-nos vivos, correriam o risco de serem castigados, descoberto que fosse o roubo que nos tinham feito; porém o capitão, que fora quem despojara a minha querida Zoraida, disse que ele se contentava com a presa e que não queria tocar em nenhum porto de Espanha, mas seguir logo a sua viagem e passar o estreito de Gibraltar de noite, ou como pudesse, até Rochela, donde tinha saído, e então resolveram dar-nos a falua do seu navio e o mais que era necessário para a curta navegação que nos restava; e com efeito assim o fizeram no dia seguinte, já à vista de terra de Espanha, e neste momento foi tamanha a nossa alegria que nos esquecemos de todas as mágoas e desgraças, como se nenhuma tivéssemos suportado; tal é a ânsia com que se deseja alcançar a liberdade perdida! Seria, pouco mais ou menos, meio-dia, quando nos meteram na barca,
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