Finalmente, veio a donzela do gomil e acabaram de lavar D. Quixote, e em seguida a das toalhas limpou-o e enxugou-o muito pausadamente; e, fazendo-lhe todas quatro uma grande e profunda mesura e cortesia, queriam-se ir embora; mas o duque, para que D. Quixote não percebesse a burla, chamou a que levava a bacia de mãos dizendo-lhe:
— Vinde-me lavar também, e vede lá não se vos acabe a água.
A rapariga, ladina e azougada, aproximou-se, e ela e as outras lavaram-no e ensaboaram-no muito depressa, e, deixando-o enxuto e limpo, foram-se embora, depois de feitas as suas mesuras. E o duque disse depois que jurara de si para si que, se elas hesitassem em o ensaboar como tinham ensaboado D. Quixote, havia de as castigar pela sua desenvoltura.
Estava Sancho atento às cerimônias daquele lavatório, e dizia consigo:
— Valha-me Deus! Será também uso nesta terra lavar as barbas aos escudeiros como aos cavaleiros! Pois eu em consciência bem precisava dessa lavagem, e até, se mas rapassem à navalha, maior benefício me fariam.
— Que estais vós a resmungar, Sancho? — perguntou a duquesa.
— Digo, senhora — respondeu Sancho — que nas cortes dos outros príncipes sempre ouvi dizer que, em se levantando a mesa, dão água às mãos, e não ensaboadela às barbas; e por isso, bom é viver muito para ver muito, ainda que dizem também que aquele que muito viver muitos trabalhos há-de passar; mas lá este lavatório é mais gosto do que desgosto.
— Não vos aflijais, amigo Sancho — disse a duquesa — que eu farei com que as minhas donzelas vos lavem, e até vos metam na barrela, se for necessário.
— Contento-me com a lavagem das barbas — respondeu Sancho — pelo menos por agora.
— Mestre-sala — disse a duquesa — fazei tudo o que Sancho vos pedir, e cumpri-lhe a vontade ao pé da letra.