Agradecendo-lhe D. Quixote, comeu alguma coisa, e Sancho comeu muito: deitaram-se ambos a dormir, deixando entregues ao seu alvedrio, pastando a abundante erva de que estava cheio aquele prado, os seus dois companheiros e amigos, Rocinante e o ruço. Despertaram um pouco tarde; tornaram a montar a cavalo e a seguir o seu caminho, apressando o passo para chegarem a uma venda, que se descobria a coisa duma légua de distância; digo que era venda, porque D. Quixote assim lhe chamou, fora do uso que tinha de chamar a todas as vendas castelos. Chegaram, pois, a essa venda e perguntaram ao estalajadeiro se havia pousada; respondeu-lhes que sim, e com toda a comodidade e regalo que em Saragoça podiam encontrar. Apearam-se, e recolheu Sancho a sua despensa num aposento, de que o estalajadeiro lhe deu a chave. Levou os animais para a cavalariça, deitou-lhes as rações, saiu para receber as ordens de D. Quixote, que estava sentado num poial, e deu graças especiais ao céu por seu amo não ter tomado aquela venda por castelo. Chegou a hora da ceia; foram para os seus quartos, e perguntou Sancho ao seu hospedeiro o que tinha para lhes dar de cear, e o estalajadeiro respondeu que podiam pedir por boca; que, de pássaros dos ares, aves do céu e peixes do mar, estava fornecida a sua venda.
— Não é preciso tanto — respondeu Sancho — com dois frangos que nos assem, ficaremos satisfeitos, porque meu amo é delicado e come pouco, e eu não sou nenhum glutão por aí além.
Replicou o estalajadeiro que não havia frangos, porque lhos tinham roubado os milhafres.
— Pois mande o senhor estalajadeiro assar uma franga que seja tenra.
— Franga! pai do céu! — respondeu o estalajadeiro — olhe que mandei ontem à cidade vender mais de cinquenta; mas, a não serem frangas, peça Vossa Mercê o que quiser.