Se vierem pelo outro lado, podemos passar por essa porta, se já tivermos acabado o nosso trabalho, ou esconder-nos atrás das cortinas, caso contrário. Entende?
Assenti e coloquei-me junto à porta. A minha sensação inicial de medo passara e agora sentia um entusiástico vigor que era maior que aquele que sentia quando éramos defensores da lei em vez de seus infractores. O elevado objectivo da nossa missão, a consciência de que ele era altruísta e cavalheiresco, o carácter velhaco do nosso opositor, tudo isto servia para intensificar o interesse da aventura. Longe de me sentir culpado, regozijava-me e exultava com os perigos que corríamos. Com profunda admiração, observei Holmes abrir o estojo de instrumentos e escolher a ferramenta com a precisão calma e científica de um cirurgião que inicia uma delicada operação. Sabia que a abertura de cofres era um dos seus passatempos preferidos e compreendi a alegria que lhe dava confrontar-se com aquele monstro verde e dourado, o dragão que detinha na sua mandíbula a reputação de tantas belas donzelas. Depois de virar os punhos do casaco - colocara, entretanto, o sobretudo numa cadeira -, Holmes escolheu duas brocas, um pé-de-cabra e várias gazuas. Eu estava junto à porta do meio a vigiar as outras, pronto para qualquer emergência, embora, na realidade, os meus planos fossem bastante vagos quanto ao que deveria fazer se fôssemos interrompidos. Durante meia hora, Holmes trabalhou com concentrada energia, pousando um instrumento, pegando noutro, manobrando cada um com a força e delicadeza de um mecânico experimentado. Finalmente, ouvi um clique, a grande porta verde abriu-se e vi no interior uma série de maços de papel, cada um amarrado, selado com lacre e devidamente identificado.