O rei ficou horrorizado com a minha descrição daqueles terríveis artefactos e com a minha proposta. Surpreendeu-o que um bichinho tão impotente e servil como eu, para utilizar as suas próprias palavras, pudesse albergar ideias tão desumanas e que o fizesse com tanta naturalidade, sem mostrar qualquer género de perturbação perante cenas tão sanguinolentas e desoladoras, consequência inevitável daquelas máquinas destrutivas, cujo autor deveria ter sido, em sua opinião, algum génio maldito, inimigo da espécie humana. Acrescentou ainda que, embora nada houvesse que mais lhe agradasse que as novas descobertas na área da arte ou da natureza, preferia perder metade do reino a ser cúmplice de semelhante segredo, ordenando-me também que nunca mais falasse no assunto se tinha apreço a minha vida.
É curioso o efeito de princípios tão limitados e de uma visão tão estreita como a de um príncipe com tantas qualidades dignas de veneração, afecto e estima, como a fortaleza, sabedoria e profunda cultura, dotado de um admirável talento para governar, quase adorado pelos seus súbditos, e que por respeitáveis, ainda que inúteis, escrúpulos, que desconhecemos na Europa, deixara fugir das mãos uma oportunidade que o teria tornado senhor das vidas, liberdades e riquezas das suas gentes.