O Bobo - Cap. 5: V - A madrugada Pág. 42 / 191

– Nunca!? – interrompeu Fernando Peres. – Cria eu contrário: tinha talvez razão para o crer. Se, porém, não é Dulce a dama dos teus afectos, ousarei eu perguntar a Garcia Bermudes o nome da sua amada e a causa do seu padecer?

No tom destas palavras havia o que quer que era de ironia e motejo.

– Conde de Trava – replicou o cavaleiro –, só disse que jamais fui amado por Dulce: não que eu não a amava. Nunca o encobri a ninguém, e vós sabeis que muitos segredos meus, que todos ignoram, nunca de vós os escondi.

O modo sentido e de amarga repreensão com que Garcia respondera fizeram conhecer a Fernando Peres que a ferida aberta naquele coração era dolorosa e profunda. Então, estendendo de novo para ele o braço, disse-lhe sorrindo:

– Vamos: falemos sério e perdoa o meu gracejar. Se amas Dulce, ela será tua. Cóleras de amantes passam como a nuvem varrida do norte; e que não fosse assim, seria eu o tufão que a afugentasse. Sabes que Dulce é a filha adoptiva da rainha. Será tua esposa a um aceno do conde de Trava; e não é o conde de Trava o teu mais verdadeiro amigo? Oh, abre-me o teu coração!

E apertava entre as suas a mão do cavaleiro.

Garcia Bermudes alevantou para ele os olhos húmidos e tristes. Por algum tempo ficou em silêncio, e por fim exclamou:

– Não sabes o mal que me fizeste; não sabes o bem que ora me fazes! Sufocava-me o peso da minha agonia: deixá-la, enfim, dilatar- se!





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