Amor de Perdição - Cap. 2: Capítulo 2 Pág. 9 / 145

Os quinze anos de Simão têm aparência de vinte. É forte de compleição; belo homem com as feições de sua mãe, e a corpulência dela; mas de todo avesso em génio. Na plebe de Viseu é que ele escolhe amigos e companheiros. Se D. Rita lhe censura a indigna eleição que faz, Simão zomba das genealogias, e mormente do general Caldeirão que morreu frito. Isto bastou para ele granjear a malquerença de sua mãe. O corregedor via as coisas pelos olhos de sua mulher, e tomou parte no desgosto dela, e na aversão ao filho. As irmãs temiam-no, tirante Rita, a mais nova, com quem ele brincava puerilmente, e a quem obedecia, se lhe ela pedia, com meiguices de criança, que não andasse com pessoas mecânicas.

Finalizavam as férias, quando o corregedor teve um grande dissabor. Um dos seus criados tinha ido levar a beber os machos, e, por descuido ou propósito, deixou quebrar algumas vasilhas que estavam à vez no parapeito do chafariz. Os donos das vasilhas conjuraram contra o criado; espancaram-no. Simão passava nesse ensejo; e, armado dum fueiro que descravou dum carro, partiu muitas cabeças, e rematou o trágico espectáculo pela farsa de quebrar todos os cântaros. O povoléu intacto fugira espavorido, que ninguém se atrevia ao filho do corregedor; os feridos, porém, incorporaram-se e foram clamar justiça à porta do magistrado.

Domingos Botelho bramia contra o filho, e ordenava ao meirinho-geral que o prendesse à sua ordem. D. Rita, não menos irritada, mas irritada como mãe, mandou, por portas travessas, dinheiro ao filho para que, sem detença, fugisse para Coimbra, e esperasse lá o perdão do pai.

O corregedor, quando soube o expediente de sua mulher, fingiu--se zangado, e prometeu fazê-lo capturar em Coimbra. Como, porém, D. Rita lhe chamasse brutal nas suas vinganças, e estúpido juiz de uma rapaziada, o magistrado desenrugou a severidade postiça da testa, e confessou tacitamente que era brutal e estúpido juiz.





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