O Crime do Padre Amaro - Cap. 8: Capítulo 8 Pág. 112 / 478

E o cônego, sentado numa cadeira de braços, com o capote pelos ombros, os pés embrulhados num cobertor, amodorrado no calor do lume, com o Breviário sobre os joelhos, dormitava. Na dobra do cobertor, a Trigueira estirada dormitava como ele.

Aos passos de Amaro o cônego abriu muito devagar os olhos, rosnou:

- Ia adormecendo, hem!

- É cedo, disse o padre Amaro. Ainda não tocou a recolher. Então que preguiça é essa?

- Ah! é você? disse o cônego com um enorme bocejo. Cheguei tarde de casa do abade, tomei uma gota de chá, veio o quebranto... Então que é feito?

- Vim por aqui.

- Pois o abade deu-nos um rico jantar. A cabidela estava de mão- cheia! Eu carreguei-me um bocado, disse o cônego rufando com os dedos na capa do Breviário.

Amaro, sentado ao pé dele, remexia devagar o brasido:

- Sabe você, padre-mestre? disse ele de repente. Ia acrescentar: - Aconteceu-me um caso! - Mas reteve-se, murmurou: - Estou hoje esquisito; tenho andado ultimamente fora dos eixos...

- Você, com efeito, anda amarelo, disse o cônego, considerando-o. Purgue-se, homem!

Amaro esteve um momento calado, a olhar o lume.

- Sabe? estou com ideia de mudar de casa.

O cônego ergueu a cabeça, arregalou os olhinhos sonolentos:

- Mudar de casa! Ora essa! por quê?

O padre Amaro chegou a cadeira para ele, e falando baixo:

- Você percebe... Tenho estado a pensar, é assim esquisito estar em casa de duas mulheres, com uma rapariga...

- Ora, histórias! Que me vem você contar? Você é hóspede... Deixe- se disso, homem! É como quem está na hospedaria.

- Não, não, padre-mestre, eu cá me entendo...

E suspirou; desejava que o cônego o interrogasse, facilitasse as confidências.





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