Apenas fechou a carta, as folhas de papel branco espalhadas diante dela deram-lhe o desejo de escrever ao padre Amaro. Mas o quê? Confessar-lhe o seu amor, com a mesma pena, molhada na mesma tinta, com que aceitava por marido o outro?... Acusá-lo da sua cobardia, mostrar o seu desgosto - era humilhar-se! E apesar de não ter motivo para lhe escrever, a sua mão ia traçando com gozo as primeiras palavras: "Meu adorado Amaro..." Deteve-se, considerando que não tinha por quem mandar a carta. Ai! tinham de separar-se assim, em silêncio, para sempre!... Separarem-se por quê? - pensou. Depois de casada podia bem ver o Sr, padre Amaro. E a mesma ideia voltava, sutilmente, mas numa forma tão honesta agora, que a não repelia: decerto, o Sr. padre Amaro podia ser o seu confessor; era em toda a cristandade a pessoa que melhor guiaria a sua alma, a sua vontade, a sua consciência; haveria então entre eles uma troca deliciosa e constante de confidências, de doces admoestações; todos os sábados iria receber ao confessionário, na luz dos seus olhos e no som das suas palavras, uma provisão de felicidade; e aquilo seria casto, muito picante, e para a glória de Deus.
Sentiu-se quase satisfeita com a impressão, que não definia bem, duma existência em que a carne estaria legitimamente contente, e a sua alma gozaria os encantos duma devoção amorosa. Tudo vinha a calhar bem, por fim... E daí a pouco dormia serenamente, sonhando que estava na sua casa, com o seu marido, e que jogava a manilha com as velhas amigas, no meio do contentamento de toda a Sé, sentada nos joelhos do senhor pároco.
Ao outro dia a Ruça levou a carta a João Eduardo, e toda a manhã as duas senhoras, costurando à janela, falaram do casamento.