O Crime do Padre Amaro - Cap. 11: Capítulo 11 Pág. 186 / 478

Dai a dias tinha havido na Sé o Ofício de corpo presente pelo rico proprietário Morais, que morrera dum aneurisma, e a quem sua esposa (em penitência decerto dos desgostos que lhe dera com a sua afeição desordenada por tenentes de infantaria), estava fazendo, como se disse, "exéquias de pessoa real". - Amaro desvestira-se, e na sacristia, à luz dum velho candeeiro de latão, escrevia assentos atrasados, quando a porta de carvalho rangeu, e a voz agitada de Natário disse:

- Ó Amaro, você está aí?

- Que temos?

O padre Natário fechou a porta, e atirando os braços para o ar:

- Grande novidade, é o escrevente!

- Que escrevente?

- O João Eduardo! É ele! É o liberal! Foi ele que escreveu o Comunicado!

- Que me diz você? fez Amaro atônito.

- Tenho provas, meu amigo! Vi o original, escrito pela letra dele. O que se chama ver! Cinco tiras de papel!

Amaro, com os olhos esgazeados, fitava Natário.

- Custou, exclamou Natário. Custou, mas soube-se tudo! Cinco tiras de papel! E quer escrever outro! O Sr. João Eduardo! O nosso rico amigo Sr. João Eduardo!

- Você está certo disso?

- Se estou certo! Estou a dizer-lhe que vi, homem!

- E como soube você, Natário?

Natário dobrou-se; e com a cabeça enterrada nos ombros, arrastando as palavras:

- Ah, colega, lá isso... Os comos e os porquês... Você compreende... Sigillus magnus!

E com uma voz aguda de triunfo, a largos passos pela sacristia:

- Mas ainda isto não é nada! o Sr. Eduardo, que nós víamos ali na casa da S. Joaneira, tão bom mocinho, é um patife antigo. É o intimo do Agostinho, o bandido da Voz do Distrito! Está metido na redação até altas horas da noite... Uma orgia, vinhaça, mulheres... E gaba-se de ser ateu... Há seis anos que se não confessa... Chama-nos a canalha canônica...





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