O Crime do Padre Amaro - Cap. 14: Capítulo 14 Pág. 243 / 478

- Caramba, quero ver isso! Quero mandá-lo à rapaziada em Lisboa!... E que efeito fez?

- Um escândalo, mestre.

- E os padrecas?

- Em brasa!

- Mas como souberam que eras tu?

João Eduardo encolheu os ombros. O Agostinho não o dissera. Desconfiava da mulher do Godinho, que o sabia pelo marido, e que o fora meter no bico do padre Silvério, seu confessor, o padre Silvério da Rua das Teresas...

- Um gordo, que parece hidrópico?

- Sim.

- Que besta! rugiu o tipógrafo com rancor.

Olhava agora João Eduardo com respeito, aquele João Eduardo que se lhe revelara inesperadamente um paladino do livre pensamento.

- Bebe, amigo, bebe! dizia-lhe, enchendo-lhe o copo com afeto, como se aquele esforço heróico de liberalismo necessitasse ainda, depois de tantos dias, reconfortos excepcionais.

E que se tinha passado? Que tinha dito a gente da Rua da Misericórdia?

Tanto interesse comoveu João Eduardo: e dum fôlego fez a sua confidência. Mostrou-lhe mesmo a carta de Amélia que ela decerto, coitada, fora levada a escrever num terror do Inferno, sob a pressão dos padres furiosos...

- E aqui tens a vítima que eu sou, Gustavo!

Era-o com efeito; e o tipógrafo considerava-o com uma admiração crescente. Já não era o Pacatinho, o escrevente do Nunes, o chichisbéu da Rua da Misericórdia - era uma vítima das perseguições religiosas. Era a primeira que o tipógrafo via; e, apesar de não lhe aparecer na atitude tradicional das estampas de propaganda, amarrado a um poste de fogueira ou fugindo com a família espavorida a soldados que galopam da sombra do último plano, achava-o interessante. Invejava-lhe secretamente aquela honra social. Que chique que lhe daria a ele entre a rapaziada de Alcântara!





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