Dois meses depois Amaro foi nomeado pároco de Feirão, na Gralheira, serra da Beira Alta. Esteve ali desde Outubro até o fim das neves.
Feirão é uma paróquia pobre de pastores e naquela época quase desabitada. Amaro passou o tempo muito ocioso, ruminando o seu tédio à lareira, ouvindo fora o Inverno bramir na serra. Pela Primavera vagaram nos distritos de Santarém e de Leiria paróquias populosas, com boas côngruas. Amaro escreveu logo à irmã contando a sua pobreza em Feirão; ela mandou- lhe, com recomendações de economia, doze moedas para ir a Lisboa requerer. Amaro partiu imediatamente. Os ares lavados e vivos da serra tinham- lhe fortificado o sangue; voltava robusto, direito, simpático, com uma boa cor na pele trigueira.
Logo que chegou a Lisboa foi à Rua dos Calafates no 53, a casa da tia: achou-a velha, com laços vermelhos numa cuia enorme, toda coberta de pó-de-arroz. Tinha-se feito devota, e foi com uma alegria piedosa que abriu os seus magros braços a Amaro.
- Como estás bonito! Ora não há! Quem te viu? Ih, Jesus! Que mudança!
Admirava-lhe a batina, a coroa: e contando-lhe as suas desgraças, com exclamações sobre a salvação da sua alma e sobre a carestia dos gêneros, foi-o levando para o terceiro andar, a um quarto que dava para o saguão.
- Ficas aqui como um abade, disse-lhe ela. E baratinho!... Ai! ter- te de graça queria eu, mas... Tenho sido muito infeliz, Joãozinho!... Ai! desculpa, Amaro! Estou sempre com Joãozinho na cabeça...
Amaro procurou logo ao outro dia o padre Liset em S. Luís. Tinha ido para França. Lembrou-se então da filha mais nova da senhora marquesa de Alegros, a Sra. D. Luísa, que estava casada com o conde de Ribamar, conselheiro de Estado, com influência, regenerador fiel desde cinquenta e um, duas vezes ministro do reino.