O Primo Basílio - Cap. 8: CAPÍTULO VIII Pág. 214 / 414

Ficou tão trémula que mal podia abrir a gavetinha da cómoda:

Tinha-me esquecido, tinha-me esquecido... - balbuciava. Deu o dinheiro a Joana; e vindo cair sobre a causeuse:

- Estou perdida! - murmurou, apertando as mãos na cabeça.

Tudo descoberto! E representaram-se-lhe logo no espírito, com a intensidade de desenhos negros sobre um muro branco, o furor de Jorge, o espanto dos seus amigos, a indignação de uns, o escárnio dos outros; e estas imagens caindo com ruído na sua alma, como combustíveis numa fogueira, ateavam-lhe desesperadamente o terror.

Que lhe restava? - Fugir com Basílio!

Aquela idéia, a primeira, a única, apossou-se dela impetuosamente, traspassou-a - como a água de uma inundação que subitamente alaga um campo.

Ele tinha-lhe tantas vezes jurado que seriam tão felizes em Paris, no seu apartamento da Rua Saint Florentin! Pois bem, iria! Não levaria malas; poria no seu pequeno saco de marroquim alguma roupa branca, as jóias da mamã... E os criados? A casa? Deixaria uma carta a Sebastião para que viesse, fechasse tudo!... Levaria na viagem o vestido de riscadinho azul - ou o preto! Mais nada. O resto compra-lo-ia longe, noutras cidades...

- Se a senhora quer vir jantar... - disse Joana à porta do quarto.

Tinha posto um avental branco, e acrescentou:

A Sra. Juliana está deitada, diz que está com a dor, não pode servir à mesa.

- Já vou.

Tomou apenas uma colher de sopa, bebeu um grande gole de água; e erguendo-se:

- Que tem ela?

- Diz que é uma dor muito forte no coração.

Se morresse! Estava salva, ela! Podia ficar, então! E com uma esperança perversa:

- Vá ver, Joana, vá ver como está!

Tinha ouvido de tantas pessoas que morrem de uma dor! Iria logo ao quarto dela rebuscar-lhe a arca, apossar-se da carta! E não teria medo do silêncio da morte, fiem da lividez do cadáver.





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