Mas algum tipo de história será escrito, afinal de contas, e depois de estarem mortos todos os que realmente se lembrarem do conflito, ele terá aceitação geral. Para todos os fins práticos, portanto. a mentira ter-se-á tornado verdade.
Sei estar em voga a afirmação de que a maior parte da história documentada não passa de mentiras. Estou pronto a crer que a história seja imprecisa e infiel, mas o que se mostra peculiar de nossa própria era é o abandono da ideia de que a história poderia ser fielmente escrita. No passado as pessoas mentiam deliberadamente, ou de modo inconsciente davam cor ao que escreviam, ou esforçavam-se por encontrar a verdade, sabendo muito bem que tinham de cometer muitos enganos; mas em todos os casos acreditavam que os "fatos" existissem e fossem mais ou menos encontráveis. E na prática sempre houve um conjunto considerável de fatos sobre os quais quase todos concordavam. Se olharmos a história da última guerra, por exemplo, na Encyclopaedia Britannica, verificaremos que respeitável soma de material informativo foi extraída das fontes alemãs. Um historiador inglês e seu colega alemão discordariam profundamente em muitas coisas, até mesmo em pontos fundamentais, mas continuaria de pé aquele conjunto de, por assim dizer, fatos neutros, no qual nenhum dos dois divergiria seriamente do outro. É exatamente essa base comum de acordo, com sua implicação de que os seres humanos são todos uma espécie de animal, que o totalitarismo vem destruir. A teoria nazista, na verdade, nega de modo bem claro que exista qualquer coisa como "a verdade". Não existe, por exemplo, coisa tal como "Ciência". Existe apenas a "Ciência Alemã", a "Ciência Judaica", etc. O objetivo contido nessa linha de pensamento é um mundo de pesadelo no qual o Dirigente, ou algum grupo governante, controla não só o futuro, mas também o passado. Se o Dirigente disser, quanto a tal ou qual acontecimento, que o mesmo jamais ocorreu, é isso mesmo - jamais ocorreu! Se disser que dois e dois são cinco - pois muito bem, dois e dois são cinco. Essa perspetiva me amedronta muito mais do que as bombas - e depois de nossas experiências nos últimos anos, não estou fazendo uma afirmação frívola.
Talvez seja infantil, no entanto, ou mesmo mórbido, apavorarmo-nos com visões de um futuro totalitário. Antes de cancelar o mundo totalitário como pesadelo que não se poderá concretizar, no entanto, convém lembrar que, em 1925, o mundo de hoje teria parecido um pesadelo sem efetivação possível.