Também via claramente o seu próprio e fútil isolamento. Não se tinha aproximado nem um passo das vidas que tentara alcançar, nem ultrapassado a impaciente vergonha e o rancor que o separavam da mãe e dos irmãos. Tinha a sensação de não ter o mesmo sangue que eles, como se existisse um místico parentesco de adopção, como se fosse filho e irmão adoptivo.
Decidiu aplacar os ferozes desejos do seu coração, diante dos quais tudo se tornava inútil e alheio. Pouco lhe importava incorrer em pecado mortal, que a sua vida se tivesse transformado numa manta de subterfúgios e falsidades. Junto do desejo selvagem que crescia dentro de si de realizar as enormidades que meditava, nada era sagrado. Aceitava cinicamente os pormenores vergonhosos dos seus impulsos secretos, exultando em profanar pacientemente todas as imagens que atraíssem o seu olhar. Movia-se, de dia e de noite, entre imagens distorcidas do mundo exterior. Uma jovem que, de dia, lhe parecera modesta e inocente, vinha ao seu encontro, de noite, através das tortuosas trevas do sono, com o rosto transfigurado por uma astúcia lasciva, com os olhos a brilhar de impúdica alegria. Só de manhã se atormentava com a vaga recordação de uma negra orgia, com a sua aguda e humilhante sensação de pecado.
Voltou aos seus passeios errantes. As nubladas noites outonais levavam-no de rua em rua, como sucedera, anos antes, nas tranquilas avenidas de Blackrock. Mas agora já não havia a visão dos jardins bem aparados ou das luzes fraternas nas janelas para exercerem uma benigna influência sobre ele. Só, de quando em quando, nas pausas do seu desejo, quando a luxúria que o devastava cedia o lugar e um langor mais suave, a imagem de Mercedes ressurgia do fundo da sua memória.