Amor de Perdição - Cap. 13: Capítulo 13 Pág. 92 / 145

E chorou então aquele homem de ferro. Chorou lágrimas que valiam bem as amarguras de Mariana.

– Cuide de sua filha, senhor Cruz! – disse Simão com fervente súplica ao ferrador – Deixe-me a mim, que estou vigoroso e bom. Vá consolar essa criatura, que nasceu debaixo da minha má estrela. Tire-a de Viseu: leve-a para sua casa. Salve-a, para que neste mundo fiquem duas irmãs que me chorem. Os favores que me tem feito, já agora dispensa-os a brevidade da minha vida. Daqui a dias mandam-me recolher ao oratório: bom será que sua filha ignore.

De volta, João da Cruz achou a filha prostrada no pavimento, ferida no rosto, chorando e rindo, demente, em suma. Levou-a amarrada para sua casa, e deixou a cargo doutra pessoa a sustentação do condenado.

Terribilíssimas foram então as horas solitárias do infeliz. Até àquele dia, Mariana, benquista do carcereiro e protegida pela amiga de D. Rita Preciosa, tinha franca entrada no cárcere a toda a hora do dia, e raras horas deixava sozinho o preso. Costurava, enquanto ele escrevia, ou cuidava do amanho e limpeza do quarto. Se Simão estava no leito doente ou prostrado, Mariana, que tivera alguns princípios de escrita, sentava-se à banca, e escrevia cem vezes o nome de Simão, que muitas vezes as lágrimas deliam. E isto assim, durante sete meses, sem nunca ouvir proferir a palavra amor. Isto assim, depois das vigílias nocturnas, ora em preces, ora em trabalho, ora no caminho de sua casa, onde ia visitar o pai a desoras.

Nunca mais o preso, na perspectiva da forca, viu entrar aquela doce criatura no limiar da ferrada porta, que lhe graduava o ar medindo e calculando para que as inteiras honras da asfixia as gozasse o cordel do patíbulo. Nunca mais!

E, quando evocava a imagem de Teresa, um capricho dos olhos quebrantados lhe afigurava a visão de Mariana ao par da outra. E lagrimosas via as duas.





Os capítulos deste livro