Amor de Perdição - Cap. 14: Capítulo 14 Pág. 96 / 145

Se o amas, como creio, apesar de tudo, cuida em salvá-lo. Se não ouves a minha razão, finge-te esquecida. Se podes violentar a tua dor, dissimula, faz muito por que a teu pai chegue a notícia de que lhe serás dócil em tudo, se ele tiver piedade do teu pobre amigo.

Não recalcitrou Teresa. Deu outro sorriso ao anjo da morte, e pediu-lhe que a envolvesse a ela, e ao seu amor, e à sua esperança, de todo, na negrura de suas asas.

De mês a mês recebia a abadessa de Monchique uma carta de seu primo. Eram estas cartas um respiradouro de vingança. Em todas dizia o velho que o assassino iria ao patíbulo irremediavelmente. A sobrinha não via as cartas; mas reparava nas lágrimas da compassiva freira.

A débil compleição de Teresa deperecia aceleradamente. A ciência condenou-a à morte breve. Disto foi informado Tadeu de Albuquerque, e respondeu: «Que a não desejava morta; mas, se Deus a levasse, morreria mais tranquilo, e com a sua honra sem mancha.» Era assim imaculada a honra do fidalgo de Viseu!… A honra, que dizem proceder em linha recta da virtude de Sócrates, da virtude de Jesus Cristo, e da virtude de milhões de mártires, que se deram às garras das feras, quando predicavam a caridade e o perdão aos homens!

Quantas carícias inventou a simpatia e a piedade, todas, por ministério das religiosas exemplares de Monchique, aporfiaram em refrigerar o ardor que consumia rapidamente a reclusa. Inútil tudo. Teresa reconhecia com lágrimas a compaixão, e, ao mesmo tempo, alegrava-se tirando das carícias a certeza de que os médicos a julgavam incurável.

Alguma freira inadvertida lhe disse um dia que uma sua amiga do convento dos Remédios de Lamego lhe dissera que Simão tinha sido condenado à morte.

Teresa estremeceu e murmurou, sem forças já para a exclamação:

– E eu vivo ainda! Depois orou, e chorou; mas os costumes da sua vida em paroxismos continuaram inalteráveis.

Perguntou à senhora, que lhe dera a notícia, se a sua amiga do convento dos Remédios lhe faria a esmola de fazer chegar às mãos de Simão uma carta. Prontificou-se a freira, depois que ouviu o parecer da prelada. Entendeu esta religiosa que o derradeiro colóquio entre dois moribundos não podia danificá-los na vida temporal, nem na vida eterna.





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