Esta é a carta que leu Simão, quinze dias depois do seu julgamento:
«Simão, meu esposo. Sei tudo… Está connosco a morte. Olha que te escrevo sem lágrimas. A minha agonia começou há sete meses. Deus é bom, que me poupou ao crime. Ouvi a notícia da tua próxima morte, e então compreendi por que estou morrendo hora a hora. Aqui está o nosso fim, Simão!… Olha as nossas esperanças! Quando tu me dizias os teus sonhos de felicidade, e eu te dizia os meus!… Que mal fariam a Deus os nossos inocentes desejos?!… Porque não merecemos nós o que tanta gente tem?… Assim acabaria tudo, Simão? Não posso crê-lo. A eternidade apresenta-se-me tenebrosa, porque a esperança era a luz que me guiava de ti para a fé. Mas não pode findar assim o nosso destino. Vê se podes segurar o último fio da tua vida a uma esperança qualquer. Ver-nos-emos num outro mundo, Simão? Terei eu merecido a Deus contemplar-te? Eu rezo, suplico, mas desfaleço na fé, quando me lembram as últimas agonias do teu martírio. As minhas são suaves, quase que as não sinto. Não deve custar a morte a quem tiver o coração tranquilo. O pior é a saudade, saudade daquelas esperanças que tu achavas no meu coração, adivinhando as tuas. Não importa, se nada há além desta vida. Ao menos, morrer é esquecer. Se tu pudesses viver agora, de que te serviria? Eu também estou condenada, e sem remédio. Segue-me, Simão! Não tenhas saudades da vida, não tenhas, ainda que a razão te diga que podias ser feliz, se não me tivesses encontrado no caminho por onde te levei à morte… E que morte, meu Deus!… Aceita-a! Não te arrependas. Se houve crime, a justiça de Deus te perdoará pelas angústias que tens de sofrer no cárcere… e nos últimos dias, e na presença da…»
Teresa ia escrever uma palavra, quando a pena lhe caiu da mão, e uma convulsão lhe vibrou todo o corpo por largo espaço. Não escreveu a palavra! Mas a ideia de forca parou-lhe a vida. A freira entrou na cela a pedir-lhe a carta, porque o correio ia partir.