O Crime do Padre Amaro - Cap. 4: Capítulo 4 Pág. 47 / 478

Amaro fora visitar o chantre com o cônego Dias, e tinha-lhe entregado uma carta de recomendação do Sr. conde de Ribamar.

- Conheci muito o Sr, conde de Ribamar, disse o chantre. Em quarenta e seis, no Porto. Somos amigos velhos! Era eu cura de Santo Ildefonso: há que anos isso vai!

E, reclinando-se na velha poltrona de damasco, falou com satisfação do seu tempo; contou anedotas da Junta, apreciou os homens de então, imitou-lhes a voz (era uma especialidade de sua excelência), os tiques, as caturrices, - sobretudo Manuel Passos, que ele descrevia passeando na Praça Nova, com o comprido casaco pardo e o chapéu de grandes abas, dizendo:

- Ânimo patriotas! o Xavier aguenta-se!

Os senhores eclesiásticos da câmara riram com gozo. Houve uma grande cordialidade. Amaro saiu muito lisonjeado.

Depois jantou em casa do cônego Dias, e foram passear ambos pela estrada de Marrazes. Uma luz doce e esbatida alargava-se por todo o campo; havia nos outeiros, no azul do ar, um aspecto de repouso, de meiga tranquilidade; fumos esbranquiçados saíam dos casais, e sentiam-se os chocalhos melancólicos dos gados que recolhem. Amaro parou junto da Ponte, e disse, olhando em redor a paisagem suave:

- Pois senhores, parece-me que me hei-de dar bem aqui!

- Há-de-se dar regaladamente, afirmou o cônego, sorvendo o seu rapé.

Eram oito horas quando recolheram a casa da S. Joaneira.

As velhas amigas estavam já na sala de jantar. Ao pé do candeeiro de petróleo, Amélia costurava,

A Sra. D. Maria da Assunção vestira-se, como nos domingos, de seda preta: o seu chinó, dum louro avermelhado, estava coberto com as rendas de um enfeite negro; as mãos descarnadas, calçadas de mitenes, solenemente pousadas no regaço, reluziam de anéis; do broche sobre o pescoço até ao cinto, um grosso grilhão de ouro caía com passadores lavrados.





Os capítulos deste livro