As Máscaras do Destino - Cap. 4: OS MORTOS NÃO VOLTAM Pág. 19 / 80

João, o tom de máscula impassibilidade do Robert afirmando, a voz já apagada e tão doce da Senhora L.

O Dr. X. interrompeu o que estava a dizer para acender outro cigarro, rito praticado sempre com um raro deleite de sibarita, precursor do raro prazer de se intoxicar, operação que levava a cabo metodicamente, desde os Paxás da sua adolescência até aos preciosos Abdulas de agora.

- Que linda noite! - murmurou, como se falasse consigo próprio, e, em voz alta, continuando:

- Era uma noite assim; a pouco e pouco fomos adoçando as vozes para não quebrar a harmonia da hora, daquela hora de uma sobrenatural e mágica beleza que todos nós sentimos ser uma pausa na nossa vida brutal, um momento digno de deuses na nossa feia vida de homens, uma hora feita de envolventes bruxedos, tão pesada de perfumes, tão embebida de doçura que, maquinalmente, as mãos quase esboçavam o gesto de se estender para agarrar a hora maravilhosa que sentíamos fugidia e já perdida nos momentos que passam. O riso de Madame V., num dado momento, quase nos chocou como uma falta de tato, uma inconveniência, como se ela se lembrasse de aparecer nua diante de nós todos. De repente, elevou-se no salão a voz da Lila cantando a Balada do Rei de Tule-.

Houve outrora um rei em Tule...

«A voz profunda e pastosa entrava na noite como um punhal numa ferida: dilacerava-a. A pungente melodia fez-me subir as lágrimas aos olhos, e ao coração uma turba de recordações que eu julgava perdidas no mar da vida como a taça lendária sobre as águas do mar.

«Calámo-nos todos, a ouvir. O ruído das ondas acompanhava em surdina a voz maravilhosa que subia e se espalhava na noite, que parecia concentrar-se e compreender como uma alma. Julguei naquele momento ouvir





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