As Máscaras do Destino - Cap. 5: O RESTO É PERFUME Pág. 28 / 80

A palavra dele era como a água: gotinha a cair numa raiz abrasada, regato que vai segredando profecias às ervas do chão, torrente impetuosa que tudo arrasta, que tudo leva à sua frente.

«A planície estendia-se até aos confins do horizonte, de cambiantes inverosímeis. A estrada poeirenta, quase reta. Charnecas bravias, de um e doutro lado. Aqui e ali, a rara mancha escura de uns torrões lavrados que mais tarde fariam o grande sacrifício de, mortos à sede, darem pão. Sob a serenidade austera da minha terra alentejana, lateja uma força hercúlea, força que se revolve num espasmo, que quer criar e não pode. A tragédia daquele que tem gritos lá dentro e se sente asfixiado dentro de uma cova lôbrega; a amarga revolta de anjo caído, de quem tem dentro do peito um mundo e se julga digno, como um deus, de o elevar nos braços, acima da vida, e não poder e não ter forças para o erguer sequer! Ah, meu amigo! o génio que, com o grotesco vocabulário humano, pudesse fazer vibrar a nossa sensibilidade, estorcer os nossos nervos de encontro à trágica e mentirosa insensibilidade da minha dura terra alentejana! Nem Fialho, nem nenhum! Que mar alto de desolação e de força possante a perder de vista... e o Sol a abrasar tudo, incendiário sublime a deitar fogo a tudo! E quando a chuva cai!... O misto de inefável êxtase e de sofredora humildade com que a mísera e amarga erva rasteira recebe a água fresca do céu! Moisés no monte Sinai, recebendo as palavras divinas...

«Outras vezes, íamos para o lado dos olivais, campos tão tristes, tão tristes, que toda a atmosfera parece impregnada de tristeza; até a luz é triste. Oliveiras salpicadas de cinza, sobre terras barrentas que parecem empapadas em sangue. Não se vê um vulto humano... não se ouve uma voz.





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