As Viagens de Gulliver - Cap. 5: Capítulo III Pág. 184 / 339

Porque se, no seu periélio, se aproxima a certa distância do Sol (como, de acordo com os seus cálculos, há motivos para temer) alcançará uma temperatura dez mil vezes superior à do ferro ao rubro; e ao afastar-se do Sol levará uma cauda incandescente de um milhão e catorze milhas, de forma que se a Terra passasse a uma distância de cem mil milhas do núcleo ou corpo principal do cometa inflamar-se-ia e ficaria reduzida a cinzas; que se o Sol gasta diariamente os seus raios sem ter fonte de aprovisionamento será consumido e inteiramente aniquilado, o que significará a destruição da Terra e de todos os planetas que ele ilumina.

Estas e outras reflexões fazem-nos viver em tal estado de perpétuo alarme que não conseguem dormir com tranquilidade, nem encontrar gosto nos prazeres ou diversões vulgares da vida. Quando encontram um amigo pela manhã, a primeira pergunta incide sobre a saúde do Sol, o aspecto que apresentava ao nascer e ao pôr-se, e as possibilidades de evitar a colisão com o cometa que se aproxima. Mantêm conversas com idêntico estado de espírito com as crianças que escutam histórias de duendes e de aparições, que gostam muito de as ouvir mas, acto contínuo, têm medo de Ir para a cama.

As mulheres da ilha flutuante possuem uma vitalidade transbordante; desprezam os maridos e gostam muito dos estranhos, de que existe sempre um número considerável na corte, proveniente de terra firme, ,quer devido a assuntos públicos, quer assuntos privados. Existe um grande desprezo por eles porque não têm as suas qualidades intelectuais. Entre eles as damas escolhem os seus amantes. É lamentável a facilidade e segurança com que actuam: o marido está sempre tão absorto nas suas especulações que a mulher e o amante se entregam às mais íntimas familiaridades diante das próprias barbas daquele, desde que o marido tenha papel e outros instrumentos e que o batedor não esteja presente.





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