As Viagens de Gulliver - Cap. 6: Capítulo IV Pág. 289 / 339

Estes ministros utilizam todos os altos cargos à sua disposição para se manter no poder, subornando a maioria de um senado ou de um conselho; e, finalmente, graças ao expediente denominado Acta de Humanidade (expliquei-lhe em que consistia), evitam qualquer ulterior reclamação e retiram-se da vida pública, carregados com os despojos da nação.

O palácio de um primeiro-ministro é um viveiro de políticos da mesma índole; os pajens, lacaios e porteiros seguem o exemplo dos amos e convertem-se em ministros de Estado no seu próprio campo de acção, esforçando-se por salientar os três principais ingredientes do ofício: insolência, mentira e suborno. Assim, todos mantêm uma corte de subalternos composta por pessoas de elevado coturno que, às vezes e progressivamente, baseando-se em descaramento e habilidade, chegam a ser sucessores do amo.

Este costuma ser dominado, em geral, por uma rameira decadente ou um lacaio favorito, que canalizam todos os favores e que podem chamar-se com propriedade, em última instância, governantes do reino.

Certo dia o meu amo, ao ouvir-me falar da nobreza do meu país, dignou-se fazer-me um elogio imerecido. Disse-me que devia ter nascido, com toda a certeza, de família nobre, uma vez que ultrapassava amplamente todos os yahoos da sua nação em forma, cor e limpeza, embora parecesse menos dotado quanto a força e agilidade devido possivelmente ao meu género de vida, tão diferente daqueles animais. Além disso, não só tinha o dom da palavra, mas parecia possuir alguns indícios de racionalidade, a tal ponto que, no seu círculo de amigos, era considerado um prodígio.

Observou-me que, quanto aos houyhnhnms, os brancos, os alazões e os cinzentos não tinham as formas harmónicas dos baios, dos cinzentos com manchas e dos negros; nem tão-pouco tinham nascido com os mesmos talentos espirituais, nem com a mesma capacidade de aperfeiçoá-los.





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