As Viagens de Gulliver - Cap. 3: Capítulo I Pág. 73 / 339

Deram-se ordens rigorosas para se manter em segredo o plano para vos deixar morrer de fome lentamente, mas a sentença de vos tirar os olhos seria estabelecida em acórdão. Ninguém discordou, excepto Bolgolam, o almirante que, por ser esbirro da imperatriz, defendia o seu ponto de vista, insistindo na execução, pois desde que apagastes o fogo dos seus aposentos de forma tão ilegal e infame ela passou a alimentar uma permanente inimizade contra vós.

«Dentro de três dias o vosso amigo secretário receberá a incumbência de se apresentar em vossa casa para vos ler a nota de culpa; e logo sublinhará a grande generosidade e indulgência de Sua Majestade e do Conselho, graças às quais apenas sois condenado à cegueira, coisa a que Sua Majestade não duvida que vos submetereis com humildade e reconhecimento. Isto será feito por vinte cirurgiões de Sua Majestade; e para que a operação seja levada a cabo de forma correcta, tereis de vos deitar no chão para serem disparadas flechas de ponta muito afiada para as vossas pupilas.

«Deixo à vossa atenção as medidas a tomar; e, para evitar suspeitas, devo regressar imediatamente de forma tão discreta como cheguei.»

Assim fez sua senhoria e eu fiquei só, consumido por mil dúvidas e mentalmente perplexo.

Era costume introduzido por este príncipe e pelo seu governo (muito diferente, segundo me asseguraram, das práticas de outros tempos) que, após a corre decretar uma execução cruel, quer para satisfazer o ressentimento do monarca quer a maldade de algum favorito, o imperador pronunciava sempre um discurso a todo o Conselho, sublinhando a sua grande benevolência e ternura, qualidades estas universalmente reconhecidas e proclamadas. Este discurso era imediatamente publicado em todo o reino. Nada aterrava tanto o povo como estes encómios à misericórdia de Sua Majestade;





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