Histórias Extraordinárias - Cap. 3: O PARASITA Pág. 66 / 136

Depois, parti para a residência dos Wilson.

Tudo me surgia com uma clareza espantosa e, no entanto, tudo me parecia distinto do resto da minha vida, como poderiam ter sido os incidentes do sonho mais vivo.

Estava possesso de uma espécie de dupla consciência. Havia em primeiro lugar a vontade estranha, predominante, que tinha tendência para puxar-me para o lado da pessoa que a possuía, e havia também a personalidade, mais fraca, que protestava, na qual reconhecia o meu próprio eu, lutando fracamente contra o impulso todo-poderoso, como um cão seguro pela trela respinga contra a sua corrente.

Recordo-me ainda de ter notado o conflito destas forças, mas nada me lembro da minha caminhada, nem de como entrei na casa.

Não obstante, ficou-me uma imagem extremamente nítida do meu encontro com miss Penelosa.

Encontrava-se estiraçada no canapé do pequeno toucador onde ocorriam habitualmente as nossas experiências. Tinha a cabeça apoiada numa das mãos e um cobertor de pele de tigre cobria-a parcialmente.

Quando entrei, levantou a vista com o ar de uma pessoa que está à espera e como a luz do candeeiro recaía directamente na sua cara, vi que estava muito pálida e abatida, que tinha olheiras profundas.

Sorriu-me e apontou com a mão uma cadeira ao lado dela.

Foi com a mão esquerda que fez este gesto. Adiantei-me rapidamente, tomei-lha e... só consigo pensar nisto com asco por mim próprio... levei-a apaixonadamente aos lábios.

Depois, sentei-me na cadeira conservando agarrada a mão e dei-lhe a fotografia que tinha trazido.

Conversei, conversei, falei do meu amor por ela, da mágoa que a sua doença me causara, do quanto me sentia infeliz quando devia passar longe dela uma só noite que fosse.

Mantinha-se imóvel, deixava cair sobre mim olhares imperiosos e o seu sorriso provocante.





Os capítulos deste livro