O Bobo - Cap. 11: XI - O subterrãneo Pág. 102 / 191

– Eu! – disse a mesma voz, acompanhando esta palavra com uma grande risada.

– É a voz e o rir de Dom Bibas! – exclamou o abade ainda sobressaltado. – Agora me recordo de que fica para este lado a sua humilde pousada.

O monge, o cavaleiro e todos os habitantes dos paços de Guimarães haviam-se completa e profundamente esquecido do truão, como porventura terá acontecido a mais de um dos nossos leitores.

Neste momento a luz de uma lanterna de furta-fogo deu de chapa nos vultos do Lidador e de Fr. Hilarião. À ténue claridade que nos próprios corpos se refrangia, eles viram um braço, que segurava a lanterna no vão de uma porta baixa meia cerrada, que mais parecia o ádito da pocilga de um mastim que de habitação de homens. No meio do vão escuro luziam dois olhos, e alvejavam os dentes de boca escancarada por um rir que devia ser feroz.

– Que fazes aqui, truão? – perguntou o cavaleiro colérico.

– Escutava – respondeu tranquilamente o bobo estendendo a cabeça para os dois.

– Foi desgraça tua! porque me é necessário o teu silêncio – murmurou o Lidador, largando a espada na bainha, travando do braço de Dom Bibas, e levando a mão ao punhal que tinha no cinto. O bobo não deu o menor sinal de susto e, vendo este movimento do cavaleiro, que porventura só pretendia aterrá-lo, com um tom de amargo escárnio replicou ao ouvir aquelas palavras ameaçadoras:

– Não gasteis comigo, nobre senhor, a única moeda com que vós outros os poderosos comprais não só o silêncio, mas tudo aquilo de que careceis para satisfazer paixões brutais. Se eu quisesse delatar o que vos ouvi, não fora tão louco que vos falasse.





Os capítulos deste livro