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Capítulo 11: XI - O subterrãneo

Página 107

Desde a morte de D. Henrique, o seu bobo querido caíra da grande altura do valimento ao nível dos animais domésticos; o seu fado fora o dos privados do príncipe que desceu ao túmulo; e, como sucede a estes frequentemente, se não o expulsaram do importante cargo que exercitava, foi que ninguém havia aí que o substituísse. Lançaram-no, porém, para aquele aposento baixo, triste e húmido, em que Dom Bibas desde então habitava, consolando-se do desprezo com essas horas de glória e triunfo, em que imperava, rei das festas nocturnas, nos saraus esplêndidos e nos banquetes sumptuosos, a que ele dava vida e cor com as suas agudezas e chascos.

Nesta espécie de caverna, para onde fora desterrado, o bom do truão curtira muitas horas de tédio: a solidão para qualquer alma sem afectos é um tormento real, e a alma de Dom Bibas era por esse lado uma verdadeira Tebaida. Certo dia em que deitado no seu almadraque tinha os olhos fitos numa réstia de sol que dava de chapa na parede fronteira, pareceu-lhe divisar nesta os vestígios de uma porta entaipada. A curiosidade o incitou a fazer mais atenta averiguação. Não se enganara. À força de tempo e diligências pôde abrir suficiente passagem para o esconderijo que achara. Era este um daqueles caminhos subterrâneos, comuns em quase todos os castelos da Idade Média, por onde nas últimas estreitezas os defensores dos lugares fortificados alcançavam salvar-se quando a resistência se tornava impossível. Este caminho, que parecia pertencer à fundação primitiva do Castelo de D. Muma, fora provavelmente condenado como inútil quando o genro de Afonso VI lançara em roda dos seus paços soberbos uma cinta de muros e torres inexpugnáveis.

Nunca Dom Bibas revelara o descobrimento casual que fizera. Este homem, que nada possuía, quisera ao menos possuir um segredo. E na presente ocasião aquela inocente avareza lhe punha nas mãos um rico tesouro: o cumprimento dos seus vingativos desejos. A entrada do subterrâneo era longe, e o bobo atravessando-a algumas vezes tivera o cuidado de tornar ainda mais cerradas as balças, sarças e troncos que a encobriam.

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pág. 107 (Capítulo 11)

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Capa do livro O Bobo
Páginas: 191
Página atual: 107

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I - Introdução 1
II - Dom Bibas 8
III - O Sarau 18
IV - Receios e esperanças 27
V - A madrugada 38
VI - Como de um homenzinho se faz um homenzarão 45
VII - O homem do zorame 59
VIII - Reconciliação 66
IX - O desafio 80
X - Generosidade 90
XI - O subterrãneo 97
XII - A mensagem 110
XIII - A boa corda de cânave de quatro ramais 123
XIV - Amor e vingança 141
XV - Conclusão 157
Apêndice 173