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Capítulo 9: IX - O desafio

Página 83

Não era raro em semelhantes ocasiões ver os paços dos nobres, e ainda dos reis, convertidos numa cousa hedionda e duvidosa entre a taberna e o prostíbulo, em que os filhos dos bem-nascidos mostravam que a distância moral, que eles supunham separá-los da mais vil gentalha, na realidade não existia. Se, porém, os longos e sanguinolentos homizios entre linhagem e linhagem se originavam facilmente das festas mais pacíficas, em meio das taças cheias pela mão de cordial hospitalidade, muito mais de recear era alguma rixa funesta entre homens que guardavam no coração, uns contra os outros, os mais profundos ódios humanos, os ódios dos bandos civis.

Estas considerações que haviam ocorrido ao conde ao perceber a conversação, no princípio lânguida, ir-se tornando viva e veemente; considerações em que não reparara a tempo, atento ao sistema que adoptara de esconder os seus receios e o perigo da sua situação com as aparências de tranquilidade, eram agora para ele motivo de sérios temores. A tardança, porém, do alferes-mor o inquietava ainda mais. A rainha não devia dar o sinal para acabar o festim sem que ele soubesse com certeza se tudo estava disposto para impedir a saída de Guimarães àqueles que a tentassem. As masmorras do castelo deviam povoar-se nessa noite de todos os ricos-homens da corte com quem o infante contava; mas a segurança deste golpe, que iria transtornar as esperanças do moço príncipe, dependia inteiramente da rigorosa execução daquilo que tinha ordenado a Garcia Bermudes.

Este entrou enfim na sala; mas em vez de se dirigir ao lugar que parecia haver-lhe sido guardado, rodeando a multidão de pajens enfileirados em pé atrás de seus senhores e passando por entre o tropel dos sergentes, escanções, uchões, e outros ovençais, que atendiam ao serviço do esplêndido banquete, buscou aproximar- se do conde, mas de modo tal e colocando-se em sítio onde dele fosse visto, sem que os cavaleiros, nos quais as amplas libações do pospasto começavam a produzir ruidosa alegria, o pudessem observar. Dali esperou que Fernando Peres se apercebesse da sua chegada.

Como ele viera, não da sala de armas, porém da galeria contígua, que comunicava exteriormente com ambos os aposentos seguindo todos os ângulos e sinuosidades daquela face do edifício, correu algum tempo antes que o conde reparasse no cavaleiro; tanto mais que a sua atenção era distraída pelo que se passava no topo da mesa fronteiro a ele.

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Capa do livro O Bobo
Páginas: 191
Página atual: 83

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I - Introdução 1
II - Dom Bibas 8
III - O Sarau 18
IV - Receios e esperanças 27
V - A madrugada 38
VI - Como de um homenzinho se faz um homenzarão 45
VII - O homem do zorame 59
VIII - Reconciliação 66
IX - O desafio 80
X - Generosidade 90
XI - O subterrãneo 97
XII - A mensagem 110
XIII - A boa corda de cânave de quatro ramais 123
XIV - Amor e vingança 141
XV - Conclusão 157
Apêndice 173