O Bobo - Cap. 9: IX - O desafio Pág. 85 / 191

Egas Moniz tinha apagado no seu coração o último raio de luz. Esse momento fora terrível, mas ao menos o seu amor desprezado podia converter-se em ódio, e a sua desesperação em sede de vingança. Entre ele e Dulce não estava a indiferença, estava outro amor – um rival, um cavaleiro da linhagem de Riba de Douro! As suas paixões convertiam-se todas numa só o ódio; e por esta como que lhe resfolgava o espírito. Era esperança tenebrosa e sanguinolenta a que lhe sorria, mas, enfim, era uma esperança!

Fernando Peres tentava escutar o que se dizia na outra extremidade da mesa, quando sentiu puxarem-lhe pela orla do brial. Voltou-se: era Tructesindo. O esperto pajem tinha notado quão frequentes vezes seu tio lançara os olhos inquietos para a porta: isto lhe provara que esperava alguém, e a falta do alferes-mor que esse alguém era ele. Atento então a ver se o descobria no meio dos sergentes que entravam e saíam da sala vira-o chegar. O modo por que se postara atrás dos escudeiros confirmou-lhe as suspeitas. Hesitou algum tempo, mas finalmente resolveu-se a sair da fileira dos pajens e a chegar-se ao conde.

– Meu senhor e tio – disse o rapaz em voz baixa –, vede Garcia Bermudes que despreza o seu lugar de cavaleiro.

E acrescentou: – Não o faria eu, se como ele calçasse acicates dourados.

– Por essa nova que me deste os mereces, meu sobrinho – respondeu Fernando Peres no mesmo tom. – Tê-los-ás mais cedo do que o esperas, se bem desempenhares o que te vou ordenar.

Fitara os olhos no alferes-mor: o sinal que este lhe fez desoprimiu o coração do conde.

– Tructesindo – disse ele ao pajem –, aproxima-te da rainha o mais que puderes, e dize a qualquer dos seus donzéis de modo que ela te ouça: é tempo de acabar o festim.





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