Penso que não incumbem ao senhor juiz de fora essas miudezas do estômago.
– Decerto não – redarguiu, irritado, o juiz. – Faça o que quiser. E, chamando o meirinho-geral, entregou-lhe o réu, dispensando
o aguazil de pedir força para acompanhá-lo. O carcereiro recebeu respeitosamente o preso, e alojou-o num dos quartos melhores do cárcere; mas nu e desprovido do mínimo conforto. Um outro preso emprestou-lhe uma cadeira de pau. Simão sentou-se, cruzou os braços e meditou.
Pouco depois, um criado de seu pai conduziu-lhe o almoço, dizendo-lhe que sua mãe lho mandava a ocultas, e entregando-lhe uma carta dela, cujo conteúdo importa saber. Simão, antes de tocar no almoço, cujo cabaz estava no pavimento, leu o seguinte:
«Desgraçado, que estás perdido! Eu não te posso valer, porque teu pai está inexorável. Às escondidas dele é que te mando o almoço, e não sei se poderei mandar-te o jantar!
Que destino o teu! Oxalá que tivesses morrido ao nascer.
Morto me disseram que tinhas nascido; mas o teu fatal destino não quis largar a vítima.
Para que saíste de Coimbra? A que vieste, infeliz? Agora sei que tens vivido fora de Coimbra há quinze dias, e nunca tiveste uma palavra que dissesses a tua mãe!…»
Simão suspendeu a leitura, e disse entre si:
– Como se entende isto?! Pois minha mãe não mandou chamar o João da Cruz! E não foi ela quem me mandou o dinheiro?
– Olhe que o almoço arrefece, menino! – disse o criado.