De outro que disse me desdigo, se algum inquisidor intolerável deparar aí heresia, contra-senso, atrevimento ou cousa que dúvida faça contra Plutus, único deus da única religião cujo código penal me intimida.
Há cousas incríveis neste volume? É que eu e os meus amigos literatos, poetas, jornalistas, e até redatores encartados de necrológicos sabemos passagens que arrepiam carnes e cabelos. Se o siso comum as não adopta, é que os cronistas do tempo formam, à parte, um status instatu, cousa ininteligível aos que não sabem latim, por grande fortuna sua.
Neste sinedrim há uma moral, estragada se o quiserem, mas os evangelistas, que a propagam, são Catões, contanto que os não obrigue a inquietar a sadia tranquilidade dos intestinos. Aqui, não se sacrifica um dedo a uma pisadela porque não vale a pena.
É necessário escrever, visto que há leitores.
Eu, e os meus correligionários, se até hoje não temos irradiado sobre a humanidade ondas de luz, é porque a humanidade precisava ser, muito, a concha em que, por aqui se escondiam muitos moluscos morais, que vão saindo agora a espanejar-se ao sol.
Não quero dizer que os moluscos passassem a articulados. Pode muito bem ser que o leitor, ou leitora sejam ainda legítimos moluscos; mas a excepção deplorável não claudica a generalidade. E, portanto:
Eu, e os meus amigos, mencionados acima, considerando que a candeia não deve estar muito tempo debaixo do alqueire, nem os talentos (dinheiro) soterrados vencem juros; e tendo nós, outrossim, em muito afã e desvelo desafrontar a literatura pátria de injúrias com que estrangeiros e nacionais a desconceituam, desairando-a como pobre de romances, pela sua incapacidade inventiva - o que não só é malícia, mas até aleivosia: resolvemos escrever romances em que figurassem muitas pessoas nossas conhecidas, e outras, que viremos a conhecer no decurso desta meritória tarefa.