Estava toda contente, toda viva. Falava na sua fazenda com uma vaidadezinha, satisfeita de entender da lavoura, de ser proprietária. - A cancela está fechada, parece - disse Amaro.
- Está, fez ela. - Apanhou as saias, deu uma carreirinha. Estava fechada! Que pena! E abalava, impaciente, as grades estreitas, entre as duas fortes ombreiras de madeira encravadas na espessura do silvado.
- Foi o caseiro que levou a chave!
Agachou-se, gritou para o lado do campo, arrastando muito tempo a voz: - Antônio! Antônio!
Ninguém respondeu.
- Anda lá para o fundo da quinta! disse ela. Que seca! Se o senhor pároco quisesse, aqui adiante pode-se passar. Há uma abertura no valado, chamam-lhe o salto da cabra. Pode a gente saltar para o outro lado.
E caminhando rente ao silvado, chapinhando a lama, toda alegre:
- Quando eu era pequena nunca passava pela cancela! Saltava sempre por ali. E cada trambolhão, quando o chão estava resvaladiço com a chuva! Era um vivo demônio, aqui onde me vê! Ninguém há-de dizer, senhor pároco, hem? Ai! vou-me a fazer velha! - E voltando-se para ele, com um risinho onde luzia o esmalte dos dentes:
- Não é verdade? Estou-me a fazer velha, hem?
Ele sorria. Custava-lhe falar. O sol, batendo-lhe nas costas, depois do vinho do abade, amolecia-o: e a figura dela, os seus ombros, os seus encontros davam-lhe um desejo contínuo e intenso.
- Aqui está o salto da cabra, disse Amélia parando.
Era uma abertura estreita no valado: a terra do outro lado, mais baixa, estava toda lamacenta. Via-se dali a fazenda da S. Joaneira: o campo plano estendia-se até um olival, com a erva fina muito estrelada de pequenos malmequeres brancos; uma vaca preta, de grandes malhas, pastava; e para além viam-se tetos aguçados dos casais, onde voavam revoadas de pardais.