O Crime do Padre Amaro - Cap. 9: Capítulo 9 Pág. 139 / 478

João Eduardo, tranquilizado, raciocinou que "não havia nada". Aqueles modos eram excessos de beatério. Entusiasmo pela padraria!

Amélia decidiu então disfarçar o que lhe ia no coração: sempre considerara o escrevente um pouco tapado - e se ele percebera, que fariam as Gansosos tão finas, e a irmã do cônego que era curtida em malícia! Por isso mal sentia Amaro na escada, daí por diante, tomava uma atitude distraída, muito artificial; mas, ai! apenas ele lhe falava com a sua voz suave ou voltava para ela aqueles olhos negros que lhe faziam correr estremeções nos nervos, - como uma ligeira camada de neve que se derrete a um sol muito forte, a sua atitude fria desaparecia, e toda a sua pessoa era uma expressão contínua de paixão. às vezes, absorvida no seu enlevo, esquecia que João Eduardo estava ali; e ficava toda surpreendida quando ouvia a um canto da sala a sua voz melancólica.

Ela sentia de resto que as amigas da mãe envolviam a sua "inclinação" pelo pároco numa aprovação muda e afável. Ele era, como dizia o cônego, o menino bonito: e das maneirinhas e dos olhares das velhas exalava-se uma admiração por ele que fazia ao desenvolvimento da paixão de Amélia uma atmosfera favorável. D. Maria da Assunção dizia-lhe às vezes ao ouvido:

- Olha para ele! É de inspirar fervor. É a honra do clero. Não há outro!...

E todas elas achavam em João Eduardo "um presta para nada"! Amélia então já não disfarçava a sua indiferença por ele: as chinelas que lhe andava a bordar tinham há muito desaparecido do cesto do trabalho, e já não vinha à janela vê-lo passar para o cartório.

A certeza agora tinha-se estabelecido na alma de João Eduardo - na alma, que como ele dizia, lhe andava mais negra que a noite.

- A rapariga gosta do padre, tinha ele concluído. E à dor da sua felicidade destruída juntava-se a aflição pela honra dela ameaçada.





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