O Crime do Padre Amaro - Cap. 2: Capítulo 2 Pág. 14 / 478

- É triste isto, disse Amaro.

Mas a S. Joaneira gritou de cima:

- Pode subir, senhor cônego! Está o caldo na mesa!

- Ora vá, vá, que você deve estar a cair de fome, Amaro! - disse o cônego, erguendo-se muito pesado.

E detendo um momento o pároco, pela manga do casaco:

- Vai você ver o que é um caldo de galinha feito cá pela senhora! Da gente se babar!...

No meio da sala de jantar, forrada de papel escuro, a claridade da mesa alegrava, com a sua toalha muito branca, a louça, os copos reluzindo à luz forte dum candeeiro de abajur verde. Da terrina subia o vapor cheiroso do caldo e, na larga travessa a galinha gorda, afogada num arroz húmido e branco, rodeada de nacos de bom paio, tinha uma aparência suculenta de prato morgado. No armário envidraçado, um pouco na sombra, viam-se cores claras de porcelana; a um canto, ao pé da janela, estava o piano, coberto com uma colcha de cetim desbotado. Na cozinha frigia-se; e sentindo o cheiro fresco que vinha dum tabuleiro de roupa lavada, o pároco esfregou as mãos, regalado.

- Para aqui, senhor pároco, para aqui, disse a S. Joaneira. Dai pode vir-lhe frio. - Foi fechar as portadas das janelas; chegou-lhe um caixão de areia para as pontas dos cigarros. - E o senhor cônego toma um copinho de geléia, sim?

- Vá lá, para fazer companhia, disse jovialmente o cônego, sentando- se e desdobrando o guardanapo.

A S. Joaneira, no entanto, mexendo-se pela sala, ia admirando o pároco, que, com a cabeça sobre o prato, comia em silêncio o seu caldo, soprando a colher. Parecia bem-feito; tinha um cabelo muito preto, levemente anelado. O rosto era oval, de pele trigueira e fina, os olhos negros e grandes, com pestanas compridas.

O cônego, que não o via desde o seminário, achava-o mais forte, mais viril.

- Você era enfezadito...





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