João Eduardo, porém, hesitava. Se se viesse a saber?
- Qual! afirmava Agostinho. A coisa publica-se como minha. É artigo da redação. Quem diabo vai saber?
Sucedeu na noite seguinte que João Eduardo surpreendeu o padre Amaro resvalando sorrateiramente um segredinho a Amélia - e ao outro dia apareceu de tarde na redação com a palidez de uma noite velada, trazendo cinco largas tiras de papel, miudamente escritas numa letra de cartório. Era o artigo, e intitulava-se: Os modernos fariseus! - Depois de algumas considerações, cheias de flores, sobre Jesus e o Gólgota, o artigo de João Eduardo era, sob alusões tão diáfanas como teias de aranha, um vingativo ataque ao cônego Dias, ao padre Brito, ao padre Amaro e ao padre Natário!... Todos tinham a sua dose, como exclamou cheio de júbilo o Agostinho.
- E quando sai? perguntou João Eduardo.
O Agostinho esfregou as mãos, refletiu, disse:
- É que está forte, diabo! É como se tivesse os nomes próprios! Mas descansa, eu arranjarei.
Foi cautelosamente mostrar o artigo ao doutor Godinho - que o achou "uma catilinária atroz". Entre o doutor Godinho e a Igreja havia apenas um arrufo: ele reconhecia, em geral, a necessidade da religião entre as massas; sua esposa, a bela D. Cândida, era além disso de inclinações devotas, e começava a dizer que aquela guerra do jornal ao clero lhe causava grandes escrúpulos: e o doutor Godinho não queria provocar ódios desnecessários entre os padres, prevendo que o seu amor da paz doméstica, os interesses da ordem e o seu dever de cristão o forçariam bem cedo a uma reconciliação, - "muito contra as suas opiniões, mas..."
Disse por isso a Agostinho secamente:
- Isto não pode ir como artigo da redação, deve aparecer como comunicado. Cumpra estas ordens.