O Crime do Padre Amaro - Cap. 16: Capítulo 16 Pág. 307 / 478

D. Maria vergou os ombros, humilhando-se à repreensão. E Amaro, com gravidade:

- Isto não deve sair daqui. É entre Deus e nós. Queremos salvar uma alma, consolar uma enferma, e não ter elogios nos periódicos. Pois não é assim, padre-mestre?

O cônego ergueu-se pesadamente:

- Você esta noite tem falado com a língua de ouro de S. Crisóstomo. Eu estou edificado; e não se me dava agora de ver aparecer as torradas.

Foi então, enquanto a Ruça não trazia o chá, que se decidiu que Amélia, todas as semanas, uma ou duas vezes segundo fosse a sua devoção, iria em segredo, para que a ação fosse mais valiosa aos olhos de Deus, passar uma hora à cabeceira da paralítica, ler-lhe a Vida dos Santos, ensinar-lhe rezas e insuflar-lhe a virtude.

- Enfim, resumiu a Sra. D. Maria da Assunção voltando-se para Amélia, não te digo senão uma coisa: abichaste!

A Ruça entrou com o tabuleiro, no meio dos risos que provocara a "tolice de D. Maria", como disse Amélia, que se fizera escarlate. - E foi assim que ela e o padre Amaro se puderam ver livremente, para glória do Senhor e humilhação do Inimigo.

* * *

Encontravam-se todas as semanas, ora uma ora duas vezes, de modo que as suas visitas caridosas à paralítica perfizessem ao fim do mês o número simbólico de sete, que devia corresponder, na ideia das devotas, às Sete Lições de Maria. Na véspera o padre Amaro tinha prevenido o tio Esguelhas, que deixava a porta da rua apenas cerrada, depois de ter varrido toda a casa e preparado o quarto para a prática do senhor pároco. Amélia nesses dias erguia-se cedo; tinha sempre alguma saia branca a engomar, algum laçarote a compor; a mãe estranhava-lhe aqueles arrebiques, o desperdício de água-de-colónia de que ela se inundava; mas Amélia explicava que "era para inspirar à Totó ideias de asseio e de frescura".





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