O Crime do Padre Amaro - Cap. 18: Capítulo 18 Pág. 338 / 478

E Amélia, resignando-se à vontade de Deus em tudo, ia deixando cair as saias.

Tinha agora daquelas pieguices frequentes que impacientavam o padre Amaro. Em certos dias aparecia muito murcha; trazia sempre algum sonho lúgubre a contar, que a torturara toda a noite, e em que ela pretendia descobrir avisos de desgraças...

Perguntava-lhe às vezes:

- Se eu morresse, tinhas muita pena?

Amaro enfurecia-se. Realmente era estúpido! Tinham apenas uma hora para se verem, e haviam de estar a estragá-la com lamúrias?

- É que não imaginas, dizia ela, trago o coração negro como a noite.

Com efeito as amigas da mãe estranhavam-na. às vezes, durante serões inteiros não descerrava os lábios, pendia sobre a sua costura, picando molemente a agulha; ou então, muito cansada mesmo para trabalhar, ficava junto da mesa fazendo girar devagar o abajur verde do candeeiro, com o olhar vazio e a alma muito longe.

- Ó rapariga, deixa esse abajur em paz! diziam-lhe as senhoras nervosas.

Ela sorria, dava um suspiro fatigado, e retomava muito lentamente a saia branca que havia semanas andava bainhando. A mãe, vendo-a sempre tão pálida, pensara em chamar o doutor Gouveia.

- Não é nada, minha mãe, é nervoso, passa...

O que provava a todos que era nervoso eram os sustos súbitos que a tomavam - a ponto de dar um grito, quase desmaiar, se de repente uma porta batia. Certas noites mesmo, exigia que a mãe viesse dormir ao pé dela, com medo de pesadelos e de visões.

- É o que diz sempre o Sr. doutor Gouveia, observava a mãe ao cônego, é uma rapariga que necessita casar...

O cônego pigarreava grosso.

- Não lhe falta nada, resmungava. Tem tudo o que precisa. Tem de mais, ao que parece...





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