O Crime do Padre Amaro - Cap. 22: Capítulo 22 Pág. 405 / 478

Tinha-lhe escrito outra carta. Ela não respondera.

Então jurava não voltar à Ricoça, desprezá-la, - mas depois de ter passado a noite, rolando-se pela cama sem poder dormir, com a mesma visão da nudez dela cravada intoleravelmente no cérebro, lá partia de manhã para a Ricoça, corando quando o apontador das obras na estrada, que o via passar todos os dias, lhe tirava o seu boné de oleado.

Numa tarde que chuviscava, ao entrar no casarão, dera com o abade Ferrão que à porta abria o seu guarda-chuva.

- Olá, por aqui, senhor abade? disse ele.

O abade respondeu naturalmente:

- Em vossa senhoria é que não há que estranhar, que vem por aqui todos os dias...

Amaro não se conteve; e tremendo de cólera:

- E que lhe importa ao senhor abade se eu venho ou não? A casa é sua?

Aquela brutalidade tão injustificável ofendeu o abade:

- Pois era melhor para todos que não viesse...

- E por quê, senhor abade? e por quê? gritou Amaro, perdido.

Então, o bom homem estremeceu. Cometera, ali, a culpa mais grave do sacerdote católico: o que sabia de Amaro, dos seus amores, era em segredo de confissão; e era trair o mistério do sacramento, mostrar que desaprovava aquela insistência no pecado. Tirou muito baixo o seu chapéu e disse humildemente:

- Tem vossa senhoria razão. Peço perdão do que disse sem refletir. Muito boas-tardes, senhor pároco.

- Muito boas-tardes, senhor abade.

Amaro não entrou na Ricoça. Voltou para a cidade sob a chuva que batia forte agora. E, apenas em casa, escreveu uma longa carta a Amélia, em que lhe contava a cena com o abade, acabrunhando-o de acusações - sobretudo de lhe trair indiretamente o segredo da confissão. Como das outras, desta carta não veio resposta da Ricoça.





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