Tinha-lhe escrito outra carta. Ela não respondera.
Então jurava não voltar à Ricoça, desprezá-la, - mas depois de ter passado a noite, rolando-se pela cama sem poder dormir, com a mesma visão da nudez dela cravada intoleravelmente no cérebro, lá partia de manhã para a Ricoça, corando quando o apontador das obras na estrada, que o via passar todos os dias, lhe tirava o seu boné de oleado.
Numa tarde que chuviscava, ao entrar no casarão, dera com o abade Ferrão que à porta abria o seu guarda-chuva.
- Olá, por aqui, senhor abade? disse ele.
O abade respondeu naturalmente:
- Em vossa senhoria é que não há que estranhar, que vem por aqui todos os dias...
Amaro não se conteve; e tremendo de cólera:
- E que lhe importa ao senhor abade se eu venho ou não? A casa é sua?
Aquela brutalidade tão injustificável ofendeu o abade:
- Pois era melhor para todos que não viesse...
- E por quê, senhor abade? e por quê? gritou Amaro, perdido.
Então, o bom homem estremeceu. Cometera, ali, a culpa mais grave do sacerdote católico: o que sabia de Amaro, dos seus amores, era em segredo de confissão; e era trair o mistério do sacramento, mostrar que desaprovava aquela insistência no pecado. Tirou muito baixo o seu chapéu e disse humildemente:
- Tem vossa senhoria razão. Peço perdão do que disse sem refletir. Muito boas-tardes, senhor pároco.
- Muito boas-tardes, senhor abade.
Amaro não entrou na Ricoça. Voltou para a cidade sob a chuva que batia forte agora. E, apenas em casa, escreveu uma longa carta a Amélia, em que lhe contava a cena com o abade, acabrunhando-o de acusações - sobretudo de lhe trair indiretamente o segredo da confissão. Como das outras, desta carta não veio resposta da Ricoça.