O Crime do Padre Amaro - Cap. 22: Capítulo 22 Pág. 410 / 478

- Isso não é difícil, Sr. Morgado, dizia o abade tomando tranquilamente a sua pitada. Que já não há forca em Portugal...

Então era uma indignação do Morgado. Não havia forcas? E por que não? Porque tínhamos um governo livre e um rei constitucional! Que se se seguisse a vontade dos padres, havia uma forca em cada praça e uma fogueira em cada esquina!

- Diga-me uma coisa, Sr. Ferrão, o senhor vem defender aqui em minha casa a Inquisição?

- Oh, Sr. Morgado, eu nem sequer falei da Inquisição...

- Não falou por medo! Porque sabe perfeitamente que lhe enterrava uma faca no estômago!

E tudo isto aos gritos e aos pulos pela sala, fazendo um vendaval com as abas prodigiosas do seu robe-de-chambre amarelo.

- No fundo um anjo, dizia o abade a João Eduardo. Capaz de dar a camisa mesmo a um padre, se o soubesse em necessidade... E você aqui está bem, João Eduardo... É não lhe reparar nas manias...

Tinha tomado afeição a João Eduardo, o abade Ferrão: e sabendo por Amélia a famosa legenda do Comunicado quisera, segundo a sua expressão querida, "folhear o homem aqui e além". Conversava com ele tardes inteiras na rua de loureiros da quinta, na residência onde João Eduardo se ia fornecer de livros; e sob o "exterminador de padres", como dizia o Morgado, encontrara um pobre moço sensível, com uma religião sentimental, ambições de paz doméstica, e prezando muito o trabalho. Então viera-lhe uma ideia que, sobretudo por lhe ter acudido num dia que saia das suas devoções ao Santíssimo, lhe parecia descida de cima, da vontade do Senhor: era o casá-lo com Amélia.





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