Ai, filhos! papei-a logo, venho mesmo consoladinho!
A Gertrudes, a velha e possante ama do abade, entrou então com a vasta terrina do caldo de galinha: e o Libaninho, saltitando em redor dela, começou os seus gracejos:
- Ai, Gertrudinhas, quem tu fazias feliz, bem eu sei!
A velha aldeã ria, com o seu espesso riso bondoso, que lhe sacudia a massa do seio.
- Olha que arranjo me aparece agora pela tarde!...
- Ai, filha! as mulheres querem-se como as pêras, maduras e de sete cotovelos. Então é que é chupá-las!
Os padres gargalharam; e, alegremente, acomodaram-se à mesa.
O jantar fora todo cozinhado pelo abade: logo à sopa as exclamações começaram:
- Sim, senhor, famoso! Disto nem no Céu! Bela coisa!
O excelente abade estava escarlate de satisfação. Era, como dizia o senhor chantre, "um divino artista" ! Lera todos os Cozinheiros completos, sabia inúmeras receitas; era inventivo - e, como ele afirmava dando marteladinhas no crânio, "tinha-lhe saído muito petisco daquela cachimônia" ! Vivia tão absorvido pela sua "arte" que lhe acontecia, nos sermões de domingo, dar aos fiéis ajoelhados para receberem a palavra de Deus, conselhos sobre o bacalhau guisado ou sobre os condimentos do sarrabulho. E ali vivia feliz, com a sua velha Gertrudes, de muito bom paladar também, com o seu quintal de ricos legumes, sentindo uma só ambição na vida - ter um dia a jantar o bispo!
- Oh senhor pároco! dizia ele a Amaro, por quem é! mais um bocadinho de cabidela, faça favor! Essas codeazinhas de pão ensopadas no molho! Isso! isso! Que tal, hem? - E com um aspecto modesto: - Não é lá por dizer, mas a cabidela hoje saiu-me boa!
Estava com efeito, como disse o cônego Dias, de tentar Santo Antão no deserto! Todos tinham tirado as capas, e, só com as batinas, as voltas alargadas, comiam devagar, falando pouco.