O Primo Basílio - Cap. 10: CAPÍTULO X Pág. 281 / 414

Seguia com satisfação a amarelidão crescente das feições de Juliana; tinha esperanças no aneurisma: não rebentaria um dia, o demônio?

E diante de Jorge tinha de a elogiar!

A vida pesava-lhe. Apenas ele pela manhã saía e fechava a cancela, logo as suas tristezas, os seus receios lhe desciam sobre a alma, devagar, como grandes véus espessos que se abatem lugubremente; não se vestia então até às quatro, cinco horas, e com o roupão solto, em chinelas, despenteada, arrastava o seu aborrecimento pelo quarto. Vinham-lhe, por momentos, de repente, desejos de fugir, ir meter-se num convento! A sua sensibilidade muito exaltada impeli-la-ia decerto a alguma resolução melodramática - se a não retivesse, com a força de uma sedução permanente, o seu amor por Jorge. Porque o amava agora, imensamente! Amava-o com cuidados de mãe, com ímpetos de concubina... Tinha ciúmes de tudo, até do ministério, até do relatório! Ia interrompê-lo a cada momento, tirar-lhe a pena da mão, reclamar o seu olhar, a sua voz; e os passos dele no corredor davam-lhe o alvoroço dos amores ilegítimos...

De resto ela mesma se esforçava por desenvolver aquela paixão, achando nela a compensação inefável das suas humilhações. Como lhe viera aquilo? Porque sempre o amara, decerto, reconhecia-o agora - mas não tanto, não tão exclusivamente! Nem ela sabia. Envergonhava-se mesmo, sentindo vagamente naquela violência amorosa pouca dignidade conjugal; suspeitava que o que tinha era apenas um capricho. Um capricho por seu marido! Não lhe parecia rigorosamente casto... Que lhe importava, de resto? Aquilo fazia-a feliz, prodigiosamente. Fosse o que fosse, era delicioso!

Ao princípio a idéia do outro pairava constantemente sobre esse amor, pondo um gosto infeliz em cada beijo, um remorso em cada noite.





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