Um dia teve, enfim, uma grande esperança. Entrara para o serviço da senhora D. Virgínia Lemos, uma viúva rica, tia de Jorge, muito doente, quase a morrer com um catarro de bexiga. A tia Vitória, a inculcadeira, preveniu-a:
- Tu trata a velha, apaparica-a, que ela o que quer é uma enfermeira que a sofra. É rica, não é nada apegada ao dinheiro; é capaz de te deixar uma independência!
Durante um ano Juliana, roída de ambição, foi a enfermeira da velha. Que zelos! Que mimos!
Virgínia era muito rabugenta; a idéia de morrer enfurecia-a; quanto mais ela ralhava com a sua voz gutural, mais Juliana se fazia serviçal. A velha, por fim, estava enternecida, gabava-a às pessoas que a vinham ver, chamava-lhe a sua providência. Tinha-a recomendado muito a Jorge.
- Não há outra! Não há outra! - exclamava.
- Pois apanhaste - dizia-lhe a tia Vitória. - Pelo menos deixa-te o teu conto de réis.
Um conto de réis! Juliana, de noite, enquanto a velha gemia no seu antigo leito de pau-santo, via o conto de réis à claridade mórbida que dava a lamparina, reluzir em pilhas de ouro inesgotável e prodigioso. Que faria com o dinheiro? E, à cabeceira da doente com um cobertor pelos ombros, os olhos dilatados e fixos, planeava: poria uma loja de capelista! Vinham-lhe logo lampejos vivos de outras
felicidades: um conto de réis era um dote, poderia casar, teria um homem!
Estavam acabadas as canseiras.