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Capítulo 13: Capítulo 13

Página 165
Torna-se necessário compreender o sentimento da época - a atmosfera horrível de desconfiança e ódio, as mentiras e boatos circulando por toda a parte, os cartazes a proclamar nos tapumes que eu e os outros éramos espiões fascistas. É preciso lembrar que estávamos diante do gabinete do Chefe de Polícia, em frente daquela malta imunda de informantes e agents provocateurs, qualquer um dos quais poderia saber que eu era "procurado" pela polícia. O gesto era o mesmo que apertar publicamente a mão de um alemão, durante a guerra mundial. Acredito que ele tenha achado que eu realmente não fosse espião fascista, mas ainda assim foi bom receber seu aperto de mão.

Registro o acontecimento, por banal que pareça, porque de algum modo ele se mostra típico da Espanha - dos lampejos de magnanimidade que se recebe dos espanhóis, nas piores circunstâncias. Tenho da Espanha as piores recordações, mas são pouquíssimas as recordações más que guardo dos espanhóis. Só recordo duas vezes em que fiquei seriamente enraivecido com espanhóis, e em ambas, quando reflito sobre elas, acredito que eu próprio estivesse errado. Não há a menor dúvida de que eles possuem uma generosidade, uma espécie de nobreza, que realmente não pertencem ao Século XX. É o que nos faz manter a esperança de que, na Espanha, até o fascismo adquira uma forma comparativamente mansa e tolerável. Poucos espanhóis apresentam aquela eficiência e coerência miseráveis de que um estado moderno totalitário necessita. Vimos um exemplo pequeno e curioso desse fato poucas noites antes, quando a policia vasculhara o quarto de minha esposa. A bem da verdade, essa busca fora coisa muito interessante, e eu gostaria de tê-la assistido, se bem que talvez não aguentasse.

A polícia efetuou a busca no estilo reconhecido da OGPU ou Gestapo. De madrugada bateram à porta, e seis homens entraram, ligaram a luz e logo tomaram posições diferentes no quarto, em manobra que era claramente planejada com antecedência. Depois deram uma batida em ambas as peças (havia um banheiro ligado ao quarto), com meticulosidade inconcebível. Sondaram as paredes, levantaram os capachos, examinaram o chão, apalparam as cortinas, olharam debaixo da banheira e do aquecedor, esvaziaram todas as gavetas e malas, apalparam todas as peças de roupa e as examinaram contra a luz. Confiscaram todos os papéis, inclusive os que se achavam na cesta, levando também todos os nossos livros. Entraram num êxtase de suspeita ao verificarem que possuíamos uma tradução francesa do Mein Kampf de Hitler, e se fosse o único livro por eles encontrado, nosso destino estaria selado.

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Capa do livro Homenagem à Catalunha
Páginas: 193
Página atual: 165

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Capítulo 1 1
Capítulo 2 12
Capítulo 3 19
Capítulo 4 32
Capítulo 5 39
Capítulo 6 51
Capítulo 7 64
Capítulo 8 70
Capítulo 9 81
Capítulo 10 105
Capítulo 11 130
Capítulo 12 142
Capítulo 13 157
Capítulo 14 173