Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 3: III Pág. 127 / 273

Os condenados uivam e gritam uns com os outros, sendo a sua tortura e a sua raiva intensificadas pela presença de outros seres torturados e raivosos como eles. Todo o sentido de humanidade foi esquecido. Os gritos dos pecadores atormentados enchem os mais remotos recantos do vasto abismo. As bocas dos condenados estão cheias de blasfémias contra Deus e de ódio pelos seus companheiros de tortura, e de maldições contra as almas que foram suas cúmplices no pecado. Nos tempos antigos, era costume castigar o parricida, aquele que erguera a mão assassina contra o seu pai, nas profundezas do mar, dentro de uma saca, na qual eram introduzidos um galo, um macaco e uma serpente. A intenção dos legisladores que criaram tal lei, que hoje nos parece cruel, era a de punir o criminoso na companhia de animais hostis e odiosos. Mas o que é a fúria desses animais irracionais comparada com a fúria das imprecações que irrompem dos lábios ressequidos e das gargantas queimadas dos condenados, no Inferno, quando deparam, entre os seus companheiros de desgraça, com aqueles que os ajudaram e incitaram no pecado, aqueles cujas palavras semearam os primeiros maus pensamentos e actos nas suas mentes, aqueles cujas sugestões impudicas os levaram a pecar, aqueles cujos olhos os tentaram e os afastaram do caminho da virtude. Voltam-se contra esses cúmplices e censuram-nos e amaldiçoam-nos. Mas estão impotentes e perdidos: é tarde demais para o arrependimento.

«E finalmente considerai o horroroso tormento que representa para as almas condenadas, corruptoras e corrompidas por igual, a companhia dos demónios. Esses demónios afligem os condenados de duas maneiras, com a sua presença e com as suas censuras. Não podemos fazer uma ideia de como esses demónios são horríveis.





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