«Em oposição a esta pena da extensão, mas com ela coexistente, temos a pena da intensidade. O Inferno é o centro da iniquidade e, como sabeis, as coisas são mais intensas no seu centro do que nos pontos mais afastados. Não existem antídotos ou confortos de espécie alguma que possam temperar ou abrandar os sofrimentos infernais. Não, as coisas que são boas, tornam-se más no Inferno. A companhia, noutros locais uma fonte de conforto para os aflitos, será aí um tormento contínuo; a sabedoria, tão desejada como o maior bem do intelecto, será ali mais odiada do que a ignorância; a luz, tão cobiçada por todas as criaturas do Senhor, até à mais humilde planta da floresta, será intensamente detestada. Nesta vida, os nossos desgostos, ou não são muito duradouros ou não muito profundos, porque a natureza a eles se sobrepõe através do hábito ou lhes põe fim sucumbindo ao seu peso. Mas, no Inferno, os tormentos não podem ser ultrapassados pelo hábito, porque, embora tenham uma terrível intensidade, são, ao mesmo tempo, continuamente variáveis, cada sofrimento recebendo, por assim dizer, fogo de um outro e dotando aquele que o acendeu de uma chama ainda mais forte. Nem a natureza consegue escapar-se a essas intensas e variadas torturas sucumbindo a elas, porque a alma é sustida e conservada em sofrimento, para que este possa ser ainda maior. Uma ilimitada extensão do tormento, uma incrível intensidade do sofrimento, uma incessante diversidade de torturas - é isso que exige a divina majestade, tão ultrajada pelos pecadores; é isso que requer a santidade do Céu, escarnecida e rejeitada pelos prazeres lascivos e vis da carne corrupta; é por isso que clama o sangue do inocente Cordeiro de Deus, derramado para redenção dos pecadores, pisado pelo mais vil entre os mais vis.